domingo, 28 de dezembro de 2014

#PensarNaoDoi:
 
Relações Wi-Fi?

“... Eu não consigo viver com alguém
que não consiga viver sem mim...!”
Nadine Gordimer

                             Recebi de um amigo, do litoral, após ler uma crônica em que postei sobre as relações do amor, um material no caderno – Especial – Outubro Rosa – do Jornal Vida & Saúde, de Osório, RS.
                               Na matéria especial a cronista Marcia de Luca deixa registrado: (...) A Geração da cabeça baixa precisa arranjar tempo para a reflexão. Continua Marcia: “... Com o advento dos smarthphones, as pessoas não têm mais um tempo calmo para a reflexão. A colunista fala desta “geração da cabeça baixa”, que está sempre olhando para o celular..”.
Muitíssimo bem colocado pela gaúcha de Osório, Márcia.
                           Tem razão até porque outra situação relatada por uma amiga, esta de uma capital de grande porte, lhe chamou a atenção em um restaurante. Ela foi almoçar próximo do seu trabalho naquele dia. Como estava muito atarefada foi em um restaurante calmo, destes com cardápios, uma música leve e... Como diz minha amiga, uma refeição leve e em paz.
                           Enquanto aguardava sua refeição, minha amiga não deixou de notar, na perpendicular, à sua frente um jovem casal. Pelas alianças, casados. Ambos muito bonitos e bem vestidos, na descrição desta amiga. Chamou a atenção, primeiramente, além da beleza e do charme, os gestos muito elegantes dos dois. Algo que não vemos todos os dias. Aliás, em todos os lugares, parece que estamos – nesta dita evolução – ficando grotescos e fechados. Estamos fazendo o caminho contrário? Quando não falávamos? Parece!

Pois bem, continuou minha amiga:... Como estava calmo e poucas mesas ocupadas ela, quase que atraída pelo casal, não conseguia tirar os olhos. Tudo estava certinho demais. Ela não compreendia. Aí ela olhou, realmente, os detalhes. Ambos não trocavam uma palavra. Estavam brigados?
Não! Simplesmente cada um estava com seu smarthphones, e dedilhando como se estivessem em um jogo. Somente eram interrompidas, as “dedilhadas” ou tecladas, por uma risada. Pressentiu-a que não era simples jogos. Eles estavam se comunicando. Mas com quem? Ambos? Um frente ao outro?
                             Sim, para encurtar a história assim continuaram após a chegada dos pratos. Uma mão segurava o garfo que levava à boca o alimento, com um olho. A outra mão e o outro olho teclavam desesperadamente nos seus respectivos fones.
                            Ela comeu a salada e, perdendo, literalmente, o apetite ficou acompanhando o casal. Não almoçou naquele dia, confessou-me a noite. A conta, ao ser paga pelo do gênero masculino, dos dois autômatos, foi simplesmente continuando a dedilhar o fone entregando um cartão de crédito a garçonete.
E assim foi e saíram apenas lado a lado..  Olhando para os fones.
                           Minha amiga disse ter ficado entristecida. Eu a compreendo. Talvez por ambos formos solteiros. Quem sabe o que não faríamos em companhia de outrem?
Isso me lembrou duma citação (aforismo) de Nietzsche. Ele deixou claro: “... O cérebro verdadeiramente original não é o que enxerga algo novo antes de todo mundo, mas o que olha para coisas velhas e conhecidas, já vistas e revistas por todos, como se fossem novas. Quem descobre algo é normalmente este ser sem originalidade e sem cérebro chamado sorte...!”
                       Este tipo, por incrível que pareça ainda chamado de relação, parece estar na contramão da história ou evolução do, dito, ser humano.
                      Não consigo imaginar um casal que diz “amarem-se”  fazerem isso. Não por estar em público. Mas e, principalmente, com eles mesmos. Se houver um “pecado” em uma relação a dois é a falta de diálogo, do dizer tudo ao outro, de contar seu dia, suas frustrações, suas conquistas, seus desafios, suas saudades...
                      Não consigo me imaginar na pele deste ser “autômato” que vive com uma grande mulher e, parece, seu fone é mais importante que tudo; mandar mensagens do tal de “whatsapp” é muito superior ao amor existente entre os dois?
Bem parece que sim.
A sábia conterrânea, do litoral, Marcia de Luca, termina seu artigo dizendo:
(...) meu objetivo é oferecer a oportunidade de tentar algo novo: transformar o círculo vicioso da correria em um círculo virtuoso da paz, harmonia e amor! Você também pode “bolar” suas formas de alcançar o mesmo. Seu eu interior, sem dúvida, agradecerá!”.
Conclui Marcia, referindo-se ao seu trabalho de grupos de terapias alternativas com pessoas e casais.
                    Não sou um terapeuta como Márcia. Mas vejo, entre alunos, entre amigos reais e virtuais, nas crônicas recebidas e nos blogs que visito todos os dias.
                 O ser humano está cada vez mais sozinho em meio a multidão. Sei, a frase é “clichê”, mas tão atual. Tão verdadeira que espero estar vivendo ainda para ver a nova fase das relações após o tal de meio eletrônico que em vez de nos aproximar estamos ficando longe um do outro. É tudo ambíguo.
                   Se estiver ao lado da pessoa amada, estou ao fone “dedilhando” feliz com alguém longe? Se estou só, sinto, na maioria das vezes uma proximidade tão divina ao falar com amigos queridos a centenas de milhares de quilômetros, e outras cidades, estados e até países.
                     Converso com meu filho na  Europa, quase todos os finais de tarde, através de hangouts. Muitas vezes ao ver meu neto falando, chego a tocar a tela como se estivesse á minha frente, e não a milhares de quilômetros, do outro lado do Oceano.
É assim com amigos de Goiás, Minas Gerais, Paraíba.. Enfim!
                   Terminei a ligação, com esta amiga, que está exatamente a 2000 km de distancia dizendo, como se a tocasse: Se eu estivesse naquela situação (a do casal) eu deixaria o fone no carro ou desligaria. Minha amiga respondeu:
- Mas não somos nós que precisamos e valorizamos! São os que têm algo e ao mesmo tempo não têm tão próximos e tão longe.
                    Terminei a noite com aquele pensamento e pedindo que as energias mais fortes do Universo aproximasse mais as pessoas e que o conforto e as praticidades da vida atual na fossem empecilhos, para o carinho, a ternura, o relacionar-se como seres humanos e divinizados que somos.
O sentir... O tocar... Os cheiros e, principalmente, os abraços... O ouvir o outro e sentir-se ouvido sem que o olhar se disperse...
Ou sou muito “quadrado” ou confesso: estou no tempo errado.
Pensar não dói... Ser sozinho dá saudades... Mas ter alguém ao seu lado e tratar como objeto isso é desumanidade.
Simples assim!
  

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