Mônica
Raouf El Bayeh é
a Convidade de hoje da Sala de Protheus!
Culpa!
by Mônica Raouf El Bayeh
“... O homem pode suportar as desgraças, elas são
acidentais e vêm de fora: o que realmente dói,
na vida, é sofrer pelas próprias culpas...!”
by Oscar Wilde
A gente faz o que quer. Faz
com culpa e tudo, mas faz.
Vou lançar um álbum de
figurinhas. O tema é a culpa. Vai ter várias páginas. Para pais, amores,
filhos, regimes e gordices, segredos,
e por aí vai. Se forem descrever todas as páginas, perde o efeito surpresa e
gasta o texto todo.
Não gastaremos dinheiro. Tem
pessoas que têm culpa de gastar dinheiro e não iam querer participar. Isso seria
uma pena. Como todos têm um saco cheio de culpas, tiramos dele nossas
figurinhas. Não ouso dizer que sai de graça, porque culpa sempre sai caro. Mas
perceber que não sou a única a ter o álbum quase completo, já é bem
terapêutico.
Funcionará assim:
-
Você tem culpa de brigar com a mãe?
- Tenho muitas repetidas
dessa.
-
Quer trocar por culpa de fingir que não escuta?
- Esta já tenho, a página
quase toda.
- A sua é de pai, mãe, filho ou marido?
- Ih, de não escutar marido
eu nem tenho culpa!
- E culpa de dizer que já está chegando e nem ter saído do no banho, você
tem?
- Não, preciso dessa!
Fomos moldados em culpa. Temos
culpa até de pensar. Culpa nos trava. Serve de algema social cuja chave foi
jogada fora. Amarram-nos os pés, braços e outros lugares mais delicados. Imaginam
que, dessa forma, vão conter os perigos soltos dentro de cada um. Cinismo. A
gente faz o que quer. Faz com culpa e tudo, mas faz.
Culpas também variam social
e sexualmente. ¨Prendam suas cabras
porque meu bode está solto. Já ouviu essa máxima?
Com que orgulho pais
anunciam que seu filho, viril e comedor, está nas paradas. Filho é bode solto.
As filhas? Pererecas presas! Nada de pular livremente de brejo em brejo. Tem
raciocínio mais torto e injusto que esse? Na nossa sociedade sempre os homens
são sexualmente beneficiados. Para eles não há culpa. Vejam:
- Meninos se divertem com
seu corpo? É natural.
Meninas não podem porque é
feio. Culpa!
- Se comem todo mundo, são garanhões pegadores. Mulheres são galinhas,
piranhas, vadias e cachorras. Culpa!
- Se traem é do instinto.
Coisa de homem. Homem é assim mesmo. Mulher que trai é tudo o que já foi
descrito acima. Culpa!
- Homem mais velho, “pega as novinhas”? É sortudo.
Mulher mais velha “pega os novinhos”?
É uma velha sem-vergonha.
Será que não se enxerga?
Culpa.
Culpas doem. Temos culpa de
não amar tanto quanto deveria. Culpa por não estar tão perto quanto deveria.
Culpa por não querer ficar mais perto do que já está. Culpa de desejar, de
pensar de sentir. Ainda temos culpa por ter culpa. Ah, chega! Culpas deveriam
ser politicamente incorretas.
Os quereres não são logicamente determinados.
São desobedientes, teimosos e insinuantes. Culpa por querer? Por não querer?
Gostamos e não gostamos. Difícil gostar o tempo todo mesmo. Alguém tinha que
contar isso para as pessoas. Tem dias que é bom estar perto. Noutros, gostaria
de ter um armário para trancar as pessoas até que, eu ou elas, algum dos lados
voltasse ao normal.
Todo corpo tem histórias
para contar. Lutas, dores, amores, culpas. Tudo lá gravado. Elas ficam escritas
em na carne e na alma. A moça que, de tão tensa, parece que não tem o pescoço.
Ombro grudado na cabeça. O rapaz cujos ombros se curvaram para frente, tamanha
a tensão. As culpas nos entalham couraças. Temos a esperança de que a couraça
vá nos proteger quando nos sentimos em carne viva.
Couraças dão certo em vários
animais. Mas conosco não. Porque cristalizam e exibem o que era para ter sido
absorvido, absolvido, digerido esquecido, mas não foi. Raivas, culpas,
ressentimentos. Afeto não elaborado se tatua no corpo. Instala-se e deforma:
engorda, entorta, enfeia a pessoa. Ao invés de nos proteger, as couraças nos
expõem. E exibem, sem dó, todas as culpas que temos.
Basta de culpa. Proponho uma
greve. Colemos cartazes nas almas. Tampemos os ouvidos. Basta de censura.
Nossas reivindicações mais genuínas:
- Por pensamentos livres voando
soltos dentro de nós. Porque pensar não pode doer.
- Pelo direito de ser normal
numa anormal normalidade.
- Pela tentativa de ser,
sim, sempre e muito feliz!
Só assim a vida vale a pena!
Dos Entendimentos & Compreensões de
minha amiga de alma
Psicóloga, professora e poetisa carioca,
Mônica Raouf El Bayeh – RJ – WWW.Twitter.com/monicabayeh
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