sexta-feira, 11 de julho de 2014


O Professor, Historiador e Pesquisador
Marlon Adami de Brasília – DF –
É o convidado da Sala de Protheus

 

DECRETO 8243... Ditadura?
 
“...Na ditadura, o Poder é o monstro do povo.
Já na democracia, o povo é o monstro do Poder...!”

Juahrez Alves
 
                 O Decreto nº 8.243, de 23 de maio deste ano, que cria a “Política Nacional de Participação Social” e o “Sistema Nacional de Participação Social” tem por finalidades: 1) manter o PT, indiretamente, como protagonista dentro do governo federal (no caso de uma eventual derrota do partido nas urnas); 2) corroer a democracia representativa; 3) enfraquecer o Congresso; 4) acelerar a criação de uma nova Constituição.

                 O art. 1º do Decreto nº 8.243/2014 institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS) estabelecendo o objetivo de “fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”. E o art. 4º, I, estabelece, dentre outros objetivos da PNPS, o de “consolidar a participação social como método de governo”. Em princípio não há nada de muito estranho nisso, pois existem outras normas vigentes no Brasil que valorizam a participação social no âmbito da Administração Pública (v.g. artigos 32 e 33 da Lei nº 9.784 , de 29 de janeiro de 1999 e art. 2º, art. 4º, III, “f”, e § 1o do art. 32 da Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001).
Ocorre, no entanto, que ao contrário do que acontece com outras normas que enfatizam a participação, colocando-a como uma possibilidade ou como ferramenta de planejamento a ser ou não concretizada pelos administradores públicos, o Decreto nº 8.243 enfatiza a promoção da participação como um dever da Administração Pública Federal e, logo, acaba transformando a participação social em um “direito”. O art. 3º do referido decreto concebe a participação como um direito e o art. 5º do mesmo decreto diz que “os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta deverão, respeitadas as especificidades de cada caso, considerar as instâncias e os mecanismos de participação social, previstos neste Decreto, para a formulação, a execução, o monitoramento e a avaliação de seus programas e políticas públicas”, ou seja, o decreto amarra a atuação do governo federal à participação dos movimentos sociais, coletivos e ONGs, colocando-os como juízes do agir estatal.

 
O art. 2º, I, do Decreto nº 8.243 diz que a sociedade civil abrange “o cidadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”. Para compreender o alcance das pretensões desse decreto é preciso refletir sobre o que se entende usualmente por “movimentos sociais”, “coletivos” e sobre a temática da participação.
Há quem diga que os movimentos sociais abrangem atores coletivos de diferentes classes e com interesses distintos, entretanto, convém lembrar que além da noção de movimento social estar historicamente relacionada com movimentos que lutam por transformações sociais – amiúde mediante expedientes revolucionários -, o conceito corrente de movimentos sociais está muito longe da leitura que Gohn faz dos mesmos. A noção contemporânea de movimentos sociais não é pluralista, pois exclui grupos que procuram influenciar os governos de forma desalinhada da agenda socialista. Assim, para todos os efeitos, as associações de empresários, os grupos pró-vida, as associações religiosas cristãs não progressistas, as organizações que lutam contra o desarmamento civil, entre outras, não são considerados “movimentos sociais”. Nada que cause espécie, haja vista que a atual conceituação de movimento social é um upgrade do conceito de classes marxista.
Se em Marx existia uma classe opressora e outra oprimida, para a new left existem - dentro do vasto portfólio dos maniqueísmos que produzem - de um lado as forças “antidemocráticas”, “antipopulares” e “fascistas” e de outro os “movimentos sociais”.
                              Os coletivos, por sua vez, seguem a mesma lógica. Em verdade, pode-se afirmar que são desdobramentos ou nós dentro da rede dos movimentos sociais. Não existem “coletivos” fora da esfera de influência das esquerdas.
Os movimentos sociais e os coletivos, portanto, são aqueles que as forças de esquerda classificam como tal.
Embora o decreto coloque o cidadão dentro do conceito de “sociedade civil”, a “participação” se dará por meio dos movimentos sociais e coletivos.
                             Os regimes totalitários caracterizam-se, dentre outras coisas, pela pretensão de colocar a política no centro da vida das pessoas. Não se quer dizer com isso que os totalitarismos estão abertos a uma espécie de controle “social”, “popular” ou “cidadão”, e nem se está aqui sugerindo que tais regimes são “participativos”; longe disso. Os Estados totalitários requerem uma aparência de cidadania total.
Norberto Bobbio, ao analisar a democracia direta grega e o modelo rousseauniano de democracia, observou que “o cidadão total e o estado total são as duas faces da mesma moeda”, tendo em comum o princípio de que “tudo é política”, o que implica “a redução de todos os interesses humanos aos interesses da polis, a politização integral do homem, a resolução do homem no cidadão, a completa eliminação da esfera privada na esfera pública”.

                              O Decreto nº 8.243 acabará por criar uma identificação artificial entre a sociedade civil e os movimentos sociais, os coletivos e as ONGs. Destarte, quando movimentos sociais e coletivos, institucionalizados ou não, participarem na formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação de programas e políticas públicas do governo federal entender-se-á que foi a sociedade civil que participou.
                              A sociedade civil - ou simplesmente a sociedade - é “a esfera das relações entre indivíduos, entre grupos, entre classes sociais, que se desenvolvem à margem das relações de poder que caracterizam as instituições estatais”. O conceito de sociedade civil não é o mesmo de movimento social ou de coletivo. Movimentos sociais e coletivos fazem parte da sociedade civil, mas não a representam em sua totalidade e complexidade.

                              Gramsci cunhou a expressão aparelhos privados de hegemonia para designar as instituições da sociedade civil voltadas a estabelecer uma visão de mundo hegemônica sobre as outras visões mediante a ocupação de espaços. Apesar de o conceito de aparelho privado de hegemonia poder, em princípio, ser aplicado a organizações que representam diferentes correntes ideológicas, seu uso está umbilicalmente atrelado aos discursos e projetos socialistas orientados para a conquista da hegemonia.
                              Quando Gramsci fala em aparelhos privados ele está, em princípio, pensando especificamente em cooptar o empresariado, os proprietários, enfim, a "classe dominante", com vistas a atrelar a sociedade civil ao Estado. Com o tempo, aparelhos de outras configurações, ou seja, não necessariamente "privados" no sentido preciso do termo, foram sendo inseridos na dinâmica da luta pela hegemonia. O termo "privado" aproximou-se cada vez mais da ideia de não estatal. Dizer "privado" não quer mais necessariamente dizer "empresarial" ou algo relacionado com a classe que Gramsci considerava dominante. O crescimento vertiginoso das ONGs e o fortalecimento dos movimentos sociais trouxeram novos subsídios para uma teorização estratégica sobre os aparelhos de hegemonia.
                               Gramsci trabalha estrategicamente com o conceito genérico de “sociedade civil” (ou “sociedade civil organizada”), camuflando por meio dele a orientação para ação (que pode ou não se restringir ao campo do discurso) direcionada a movimentos específicos comprometidos com a imposição da hegemonia socialista.
No caso de o PT ser derrotado nas urnas, o Decreto nº 8.243/2014 garantirá ao partido a permanência nas estruturas do Estado por meio das organizações e movimentos a ele atrelados.


É preciso compreender que o Decreto nº 8.243/2014 é fruto de uma longa trajetória de consolidação da hegemonia socialista.
Durante todo o tempo em que esteve no comando do Estado, o PT empenhou-se em ampliá-lo, criando e fortalecendo seus aparelhos de conquista da hegemonia: os movimentos sociais, os coletivos e as ONGs.
                                As forças políticas que conduzem o Estado ampliado procuram justificá-lo e legitimá-lo por meio do expediente retórico que sugere que quem na verdade se amplia é a sociedade. Diz-se então que é a sociedade ampliada (movimentos sociais, coletivos e ONGs) que controla o Estado e não o contrário.
Se o PT fracassar nas eleições, o partido não mais conduzirá o Estado ampliado, mas subsistirá, no governo de qualquer partido, por meio da sociedade ampliada que o partido mesmo criou.
O Decreto nº 8.243/2014 rateia preventivamente a condução do governo federal entre o PT e qualquer outro grupo político que venha a assumir o poder. Não obstante, o decreto permitirá ao PT obstar e prejudicar a atuação de outro partido que eventualmente.
Como cidadão, digo eu... Pense... Não dói!

  

Baseado totalmente nas interpretações do Prof. Marlon Adami
Graduado em História - Pós Graduado em Filosofia Política -  Pesquisador – Brasília – DF –
Colaborador do Programa #RadarNews da Rádio Beto Mous em  http://www.betomous.com/p/radio-mous.html
Mais materiais inclusive em vídeos no blog do Prof. Marlon Adami - Em http://bunkerdacultura.blogspot.com.br/ 

 

 

 

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