O
Mestre e Amigo Antônio Figueiredo
Continua
suas Histórias Vividas Na Sala de Protheus:
MENINOS
NA ESCOLA!
Tão jovens... E tão autoproclamados sábios...!”.
Até
então o magistério ainda pertencia à “velha
guarda” no método e na idade e isso fazia das aulas em sua quase totalidade,
salvo o idealismo de alguns “vocacionados
educadores”, um fardo modorrento e pouco interessante. Extenuante para os docentes
e desestimulantes para os discentes, pois o método consistia na transmissão sem
questionamentos “ipsis literis” do “programa oficial” já obsoleto para a
curiosidade e rebeldia da “nova geração”.
As
matérias de “Exatas”, (Física, Química e Matemática) seguiam a
tradição da “decoreba”, (como se diz
hoje), consistindo na exposição, aplicação de exercícios e aferição, sem
quaisquer atrativos ou mesmo casos práticos de aplicabilidade, que incitassem o
aprendizado. Poucas escolas tinham um Laboratório de Química e nenhuma para
experimentos de Física.
Foi
a partir dos anos 50 que o “ativismo nacional-progressista”,
(não se entenda isso como “esquerdismo”, que era associado ao “marxismo”), começou
a influir e a desnudar a “realidade
brasileira” a partir dos bancos universitários. Destacaram-se, para citar
os mais influentes do pensamento da época: Josué de Castro, (médico nutrólogo), Florestan Fernandes,
(cientista social), Celso Furtado, (economista), Monteiro Lobato, (escritor) e Gilberto Freire, (sociólogo e antropólogo) instalando-se
assim um “realismo crítico”, que as
oligarquias políticas e econômicas dominantes insistiam em taxar de “ideias comunizantes”.
Essa foi a inovação trazida por essa nova
geração de professores e que encontrou profundo eco nos bancos escolares, ocupados
que eram por jovens recém-lançados no mercado de trabalho e oriundos das classes
mais baixas da população, mas ambiciosa em ascender posições educacionais e sociais
e que veio naquele futuro imediato a se constituir na florescente “primeira classe média” originária do “trabalho”.
No ano de 1965, após 3 anos longe dos bancos escolares, resolvi retornar
cursando o recém instituído “Científico”
no Colégio Paulo Egídio na Vila Maria. Foi minha maior motivação a pressão
exercida por meu “chefe” no Moinho
Santista, (Eng. Ronaldo, a quem aqui rendo
homenagens), pois ainda que exercesse um cargo técnico, (Cronometrista e Controlador de Produção) ele
me instigava a que eu deveria aspirar mais. A falta de mão de obra técnica de
terceiro grau na época era muito grande e como já comentei em crônica anterior,
o Diretor Industrial havia se formado “engenheiro
por correspondência” na International School.
Minha
grande surpresa começou na apresentação dos novos professores de Português,
História, Geografia e Inglês, todos eles muito jovens e muito bem apessoados e
evidentemente todos oriundos de uma classe média mais alta. A professora de
Português em especial era um “piteuzinho”
e logo deixou apaixonada a metade masculina da classe. Já a segunda grande
surpresa veio do método de ensino.
No estudo da Geografia
introduziram-se os conceitos de Geografia Econômica, que muito além de estudar
acidentes geográficos, rios, países e cidades, passou a disseminar informações sobre
as características sociais, políticas e econômicas das regiões estudadas. Não
foi pequeno o impacto da revelação das condições socioeconômicas em muitos
lugares, (a situação da República de
Biafra era humilhante), mas mais principalmente de algumas regiões
brasileiras, inclusive no Estado de São Paulo.
Já no
estudo da História começou-se a fazer uma análise mais crítica dos eventos da “história oficial”, como a Inconfidência
Mineira, a Independência e a Proclamação da República. Foi um tempo de pura
iconoclastia histórica gerada pela desconfiança de que sempre preponderaram os
interesses oligárquicos econômicos e políticos sobre as verdadeiras aspirações
e reclamos populares nacionais, ainda que imanifestos ou despercebidos.
É
histórico o ditado “vão-se os anéis e
ficam os dedos” e essa oligarquia sempre soube “dar anéis” para prudentemente manter com “mãos firmes” as riquezas hereditariamente alcançadas concentradas
e indivisíveis.
Entretanto,
a maior das surpresas veio nas aulas de Português. A professora que já seduzia
pela presença, passou a fazê-lo também pela atitude. As Análises Sintática,
Lógica e Morfológica passaram a ser feitas sobre “letras de música” e o primeiro eleito foi Chico Buarque de Holanda
e seu “Pedro Pedreiro” e isso se revelou
um atrativo em uma matéria tão “sacal”. Além
da análise propriamente dita discutia-se a beleza criativa estética e temática
e isso enriquecia o debate e a criatividade do grupo.
Além
disso, a “linda professora” começou a
se interessar pelas reivindicações e queixas dos alunos e delas se tornou “intercessora” junto à direção escolar e
isso tornou o inusitado relacionamento ainda mais estreito e o interesse de
participação dos alunos cresceu. Nesse tempo ainda não haviam grêmios estudantis
secundaristas organizados.
Como
não deixaria de acontecer, o maior interesse por essas matérias tão “humanas” gerou uma “discussão política” até então inédita no meio daqueles jovens
entre 16 e 19 anos e os debates sobre temas nacionais da época começaram a ser
uma “matéria extracurricular” no
Paulo Egídio, estendendo-se por recreios e pós-aulas. Jovens, que habitualmente
eram alienados nas “discussões adultas”, passou
a ser protagonistas e teóricos de decisões do grupo e dali irradiava para seu
convívio social e profissional as novas ideias e ideais.
Justiça
se faça aqueles professores, que jamais tentaram doutrinar ou direcionar temas
e convicções pessoais, pois ainda que jovens e tivessem “seu partido”, eram conscientes da sua responsabilidade de
educadores, além do fato de que aquela juventude era sedenta de “aprendizado sem pressupostos ideológicos”.
Eram verdadeiros “professores de
cidadania”.Para “pôr mais lenha nessa fogueira” 1965 estava definido, (desde Abril de 1964), como um “ano eleitoral” com uma esperada eleição presidencial. Os potenciais candidatos JK, Jânio Quadros, Leonel Brizola e Carlos Lacerda já rodavam o país pregando suas plataformas e programas e é evidente que essa discussão entrou na “sala de aula”.
A “jovem professora hippie” de Inglês fez tema das aulas a tradução de canções americanas e inglesas, afinal os The Beatles já causavam sensação também naquele Brasil de 1965, além de Elvis Presley, Neil Sedaka, Paul Anka e muitos outros. Era uma “juventude americanizada”, (ou “americanalhada” como classificava a Esquerda). Entretanto, também começou a falar do Movimento Hippie, suas raízes e sua relação com a Guerra do Vietnã e nos ensinou a canção “Eve of Destruction” de Barry McGuire e foi assim que começamos olhar pela “janela do mundo” e a conhecer Martin Luther King e sua luta pelos “direitos civis”.
O ano
de 1965 marcou também o início do engajamento político do movimento estudantil,
mas não no nosso meio. Isso começou através da UNE e foi tipicamente um
“movimento da classe média”, aquela que tinha acesso aos cursos universitários
de alcance impossível aos secundaristas da periferia. Uma das molas impulsoras
em São Paulo foi a passagem do show OPINIÃO, no qual era forte a influência de
Oduvaldo Vianna Filho, (o Vianinha),
Ferreira Gullar, Paulo Pontes e outros, dirigido por Augusto Boal e
apresentando Zé Kéti e Nara Leão, (posteriormente
Maria Betânia com o selvagem CARCARÁ, que levantava o público). Seguiram-se
depois Liberdade, Liberdade e Arena conta Zumbi.
Foi
também o início da era dos Festivais Universitários de Música Popular e coube à
TV Excelsior de propriedade de Mario Wallace Simonsen, que reunia no seu “cast” artistas notoriamente
progressistas, a primazia da sua organização. O primeiro grande vencedor foi ARRASTÃO
de Vinicius de Moraes e Edu Lobo e que lançou nacionalmente Elis Regina.Logo a seguir a TV Excelsior foi praticamente desmantelada por “inviabilidade financeira”, pois os anunciantes foram “convencidos” a não mais prestigiá-la e aconteceu quase simultaneamente o incidente conhecido à época como o “escândalo TIME-LIFE” e seus 6 milhões de dólares, que deram à Rede Globo o domínio da “mídia televisiva”, bem a calhar aos interesses dos Governos Militares.
Pois bem. Foi um tempo frenético de muitas canções de protesto e uma juventude que agitava “punhos e slogans”, contudo, tudo acontecia muito distante. Era uma “juventude politizada”, que já “respirava teses marxistas” desde os Anos 30. (Carlos Lacerda e Roberto de Abreu Sodré foram “comunistas” na juventude). Já a juventude da periferia não ia e nem “cabiam em seus bolsos, ideais e realidade” esses Festivais...
Das percepções e pesquisas de
Antonio Figueiredo – Entre Algum Lugar entre a Bahia e São Paulo
Economista, Escritor, Empresário, Militante
Apartidário Parlamentarismo e Voto Distrital Puro. Ex - Ativista Movimentos
Sociais Católicos/ Metalúrgico/ Estudantil (1961/73). Operário da Cidadania
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