sábado, 21 de junho de 2014


A Jornalista e Historiadora Gaúcha
Rose Santarém traz suas histórias
para a Sala de Protheus:

  

Para um Velho Marujo!

 
"... Meu corpo é de certo modo um diário. É como os marinheiros faziam, onde toda tatuagem significou algo, um tempo específico em sua vida quando você faz uma marca em você, se você faz isto em você com uma faca ou com um artista de tatuagem profissional...!"
Johnny Depp 



                                            Abrindo um "arquivo" da memória, lembrei-me dele. Assim como a canção de Chico Buarque: ... Ele veio ninguém sabe da onde... Só sei que cheirava, falava e gostava de mar... Por isso não me espantei quando um dia disse que estava desenvolvendo "guelras".  Ri a princípio. O outono no sul traz muita chuva, entendi que era uma metáfora.

                                         Este ser hibrido, meio peixe meio humano, tem uma forma própria de encarar a vida. A lucidez com que trata o efêmero, o levam as raias da loucura. Agarra o instante e convive aos tropeços com o que não é definitivo, ou seja, tudo.

                                       Dele tenho boas lembranças... Há também passagens embaraçosas. Estas, melhor esquecer.  Mas quero lembrar o tom professoral com que me alertava para que me aborrecesse menos. Gastasse menos energia (elétrica), andasse menos de carro, acumulasse menos tarefa, procrastinasse menos e jogasse menos tempo fora. São lições de vida. Algumas só agora estou resgatando.  Era uma forma de dizer que se pode ser feliz com menos. O essencial é que dá colorido á vida.
 
 
                                              Ele possui demônios internos. E em seus conflitos às vezes escolhe... Em outras se recolhe, sempre num  movimento que atrai busca e expulsa o sentido da existência.  Por vezes sua capacidade criativa é tamanha que não cabe em seu metro e oitenta de altura.  Precisa compactar tantos conhecimentos e emoções para que possa guardá-las em seu coração, que tudo compartilha com sua mente.

Outro dia disse ele, enquanto buscava a solução para problemas alheios. Seguidor de Clarice Lispector tem por hábito guardar a sua dor e ir tratar a dos outros: “Às vezes Deus acalma os ventos, noutras, acalma o marinheiro. E quando tudo já foi tentado nos ensina a nadar”.
                                          É o que peço agora a este velho marujo, que tanto aprendeu com Deus e o mar. Que me ensine a nadar... Quero também conhecer os recônditos destas águas e seguir e perseguir este ser mitológico que conhece os segredos dos oceanos e da alma humana. Sempre com uma palavra de conforto e um gesto de compaixão para com quem sempre erra tentando acertar.

Por onde andas lobo do mar...   
Por que mar navega, levando a compreensão, intuição e a percepção, já que uma força não existe sem a outra.
                                             Não pretendo arrancá-lo do anonimato que escolheu para viver. Vou considerar uma transgressão se interpretares meu texto diferente do que pensei originalmente.
 
 
                                             Sei que por mais que tentemos, não conseguimos esticar, comprar ou renegociar o nosso tempo. Tenho pressa.  Sigo então com a expectativa de encontrá-lo.  Sei que mesmo que não venhamos a caminhar para sempre juntos, também nunca conseguiremos nos separar. Nossas almas já se encontraram e estão marcadas, tatuadas, para sempre.
                                         Como diz Sharif Dean em sua belíssima composição  - No more troubles - “estou saindo agora para te encontrar no mar de mel e vinho”... Talvez eu fracasse, mas eu preciso  buscá-lo e confrontá-lo... E assim confrontando a mim mesma.  Desta forma quando o vento soprar as lembranças do passado, já terei esquecido minhas mágoas .

 
                                                                                                  

Das percepções, pensamentos e memórias.
De Rose Santarém – Historiadora e Jornalista
Passo Fundo – RS
 
 

 

 

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