A Violeta Ambiciosa!
“... Ter como objetivo vital o triunfo
pessoal tem
consequências.
Mais tarde ou mais cedo, tornamo-nos
egoístas, mais concentrados em nós mesmos, insolidários...!"
José Saramago – El Mundo - 1998
Todos nós trazemos, no âmago, uma ambição. Alguns a trazem de modo a
satisfazer a própria sobrevivência, outros de forma desenfreada acaba
influenciando a vidados outros. De modo negativo é claro.
Parodio nesta crônica a visão do grande poeta e escritor oriental Kalil
Gibran ao fazer uma metáfora do ser com uma violeta. Sim a linda flor. Assim,
quem sabe, conseguimos pensar um pouco em nossas próprias ambições.
Diz Gibran:
Era uma vez uma linda e perfumada violeta que
vivia placidamente entre suas amigas e balançava-se, feliz, no meio das outras
flores de um jardim solitário. Certa manhã , quando sua coroa estava ornada com
gotas de orvalho, ela ergueu a cabeça e olhou a seu redor. Viu uma rosa alta e viçosa, orgulhosamente
ereta, que se projetava para cima, no espaço, como uma chama ardente sobre uma
lâmpada de esmeralda.
A violeta abriu seus lábios
azuis e disse: “Que grande infortúnio o
meu, no meio destas flores! Como é humilde a posição que ocupo na presença
delas! A natureza me moldou para ser pequena e pobre... Vivo muito perto da
terra e não posso levantar a cabeça rumo ao céu azul, ou girar para o Sol, como
fazem as rosas”.
A rosa, ouvindo as palavras de
sua vizinha, sorriu e comentou: “O que
você diz é muito estranho! Você é afortunada e, no entanto não consegue
entender sua fortuna. A Natureza lhe concedeu fragrância e beleza como a
nenhuma outra... Deixe de lado tais pensamentos, contente-se com o que tem e lembre-se
de que aquele que se humilha será exaltado e aquele que se exalta será
esmagado”.
A violeta retrucou: “Você esta me consolando porque possui
aquilo que eu anseio... Tenta me amargurar com a idéia de que você é grande... Como
é dolorosa a pregação do felizardo para o coração infeliz! E como o forte é
severo quando se erige em conselheiro do fraco!”.
A Natureza ouviu o dialogo da
violeta e da rosa. Aproximou-se e disse: “O
que lhe aconteceu, minha filha violeta? Você tem sido humilde e suave em todos
os seus gestos e palavras. Terá a Ambição entrada em seu coração e entorpecido
seus sentidos?”. Com voz suplicante, a violeta respondeu: “Oh, grande mãe misericordiosa, cheia de
amor e compaixão, eu imploro, de todo coração e de toda alma, qe atenda o meu
pedido e me permita ser uma rosa por um dia”.
A Natureza replicou: “Você não sabe o que está pedindo. Não tem
noção da desgraça oculta por trás de sua ambição cega. Se fosse uma rosa, você
estaria arrependida, e o arrependimento de nada lhe valeria”. A violeta insistiu: “Mude-me em rosa, pois desejo erguer minha cabeça, bem alto, com orgulho.
E, seja qual for o meu fardo, será de minha inteira responsabilidade”.
A Natureza consentiu: ”Oh, violeta ignorante e rebelde, eu lhe
concederei o que pede. Mas se a calamidade se abater sobre você sua queixa
recairá sobre si mesma”.
E a Natureza estendeu seus dedos
misteriosos e mágicos e tocou as raízes da violeta, que imediatamente se
transformou numa rosa alta, erguendo-se acima de todas as outras flores do
jardim.
Ao entardecer, o céu ficou denso de
nuvens escuras, e os elementos em fúria perturbaram o silencio da existência
com o trovão e começaram a atacar o jardim, desencadeando uma chuva pesada e ventos
poderosos. A tempestade quebrou os ramos, arrancou as plantas pela raiz e partiu
as hastes das grandes flores, poupando somente as pequeninas que cresciam junto
da terra amiga. Aquele jardim solitário sofreu grandemente com a beligerância
do firmamento, e quando a borrasca se acalmou e o céu ficou claro, todas as flores
jaziam, destroçadas e nenhuma tinha escapado da fúria da Natureza, exceto o clã
das pequenas violetas, escondidas pelos muros do jardim.
Tendo levantado a cabeça e visto a tragédia
das flores e árvores, uma das jovens violetas sorriu feliz e chamou as
companheiras, dizendo: “Vejam o que a
tempestade fez com as flores altaneiras!”. Outra violeta disse: “Somos pequenas e vivemos perto da terra, mas
estamos a salvo da ira dos céus”. E uma terceira acrescentou: “Por sermos pobres de altura, a tempestade é
incapaz de nos subjugar”.
Naquele instante, a rainha das
violetas viu ao seu lado à violeta convertida, atirada ao chão pela tempestade
retorcida sobre a grama molhada, como um soldado abatido no campo de batalha. A
rainha das violetas levantou a cabeça e chamou a família, dizendo: “Vejam, minhas filhas, e meditem sobre o
que a Ambição fez à violeta que se tornou uma rosa orgulhosa por uma hora. Que
a visão desta cena sirva de lembrança de nossa boa sorte”.
E a rosa moribunda se moveu, reuniu
as forças, que lhe restavam e calmamente disse: “Vocês são umas simplórias satisfeitas e resignadas. Eu nunca temi a
tempestade. Ontem eu também estava satisfeita e contente com á vida, mas a
satisfação agia como uma barreira entre minha existência e a tempestade da
vida, confinando-me a uma paz doentia e a uma indolente tranqüilidade de
espírito. Eu poderia ter vivido a mesma vida que vocês levam agora,
agarrando-me amedrontada a terra... Poderia ter esperado que o inverno me
recobrisse de neve e me entregasse à morte, que decerto chamará todas as
violetas... Mas agora estou feliz porque me aventurei para fora de meu pequeno
mundo e penetrei o mistério do Universo... algo que vocês ainda não fizeram. Eu
poderia ter desconsiderado a Ambição, cuja natureza é mais alta que a minha,
mas enquanto dava ouvidos ao silencio da noite escutei o mundo celestial
dizendo a este mundo terreno:” A Ambição para além da existência é o propósito
essencial de nosso ser”.
Naquele momento, meu espírito se revoltou e meu coração ansiou por uma
posição mais elevada do que a minha limitada existência. Dei-me conta de que o
abismo não pode ouvir a canção das estrelas, e naquele instante comecei a lutar
contra minha pequenez e a ansiar por aquilo que não me pertencia, até que minha
rebeldia se tornasse um grande poder e minha ânsia, uma vontade criadora... “A
Natureza, que é o grande objeto de nossos sonhos mais fundos atendeu meu pedido
e me transformou em rosa com seus dedos mágicos.”.
A rosa se calou por um momento e, com
voz enfraquecida, mistura de orgulho e realização, disse: “Vivi por uma hora como uma rosa orgulhosa. Por algum tempo, vivi como
uma rainha. Olhei para o Universo com os olhos de uma rosa. Ouvi o sussurro do
firmamento através dos ouvidos das pétalas de rosa. Haverá alguém aqui que
possa gabar-se de honra igual?”.
Tendo assim falado, ela baixou a
cabeça e, com voz sufocada murmurou: “Morrerei
agora, pois minha alma atingiu sua meta. Finalmente estendi meu conhecimento a
um mundo que ultrapassa a caverna estreita de meu nascimento. Este é o desígnio
da vida... Este é o segredo da existência”. Em seguida, a rosa tremulou,
lentamente encolheu suas pétalas e expirou com um sorriso celestial nos
lábios... Um sorriso de realização da esperança e do propósito da vida... Um
sorriso de vitória... Um sorriso de Deus.
Você está
contente com a vida que tem?
Pode
pensar... Não Dói!
Paródia
de kalil Gibran
Entendimento
& Compreensões
Leituras
& Pensamentos da Madrugada
Publicado no sitio do Grupo Kasal - Vitória - ES -
www.konvenios.com.br/articulistas
Jornais e sitios do RS,SC e PR,
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