Não Chores
por Mim, Mariana...
“...Nesta vida, somos
apenas hóspedes, aguardando
a última moradia. Cabe a cada
um, ter a sabedoria de escolher o melhor lugar. E, o melhor
lugar do mundo é aos pés do Salvador...!”
Zinah Alexandrino
Sempre disse, que ainda que paulistano de nascimento
tenho em Minas Gerais, minha segunda terra natal e isso porque foi lá, que
viajando por todo seu território, comecei a conhecer o “interior brasileiro”. Foi lá também que me tornei “homem”, por obra e graça da “mulher mineira”, que me introduziu nos “mistérios do amor”. Entretanto, gostaria de contar uma breve historieta da
minha passagem por lá. Nos idos de 1975 conheci o casal Ricardo Wagner e Elidia, meus vizinhos em Belo Horizonte. Wagner
era de Abaeté as margens do São Francisco e Elidia de Senhora do Porto na
vertente que dividia as bacias do Rio das Velhas e Rio Doce. Eles tinham um
sitio em Afonso Arinos, no Município de Brumadinho, entre a linha do trem que
transportava minério de Aguas Claras, (região
de Belo Horizonte) e Ibirité, (região
de Brumadinho), para o Rio de Janeiro e o Rio Paraopeba, que foi minha
introdução à vida rural mineira. Para que vocês tenham uma ideia a Bacia do
Paraopeba possui 12.045 km2 de
extensão, o que corresponde a 2,5% do estado de Minas, nascendo próximo de
Conselheiro Lafaiete e desaguando no Lago de Três Marias. O Rio Paraopeba corria pela mais importante área de
mineração de ferro de Minas Gerais, (isso
foi antes do evento de Carajás) e por
isso constantemente de águas avermelhadas. Nessa
época o minério era lavado diretamente nas águas do rio, sem “barragens de resíduos” e assim
carregava em suas águas toda a contaminação de barro, além dos minérios
associados. A própria Samarco na época já tinha uma mineração na Serra do
Ibirité, (divisa de Contagem, Betim, Belo
Horizonte com Sarzedo e Brumadinho) e lavava seu minério diretamente no
Ribeirão Ibirité, que também desagua no Paraopeba. Durante
quase dois anos nossas idas ao sítio eram quase semanais e uma das atividades
era pescar. Sempre nos surpreendíamos, que daquelas águas tão poluídas
regularmente pescássemos bons mandis,
curimbatás e até surubis. O rio
que era um dos mais piscosos até o início do ciclo de mineração, resistia e a
sua fauna teimava em se adaptar e reproduzir. Caçávamos também regularmente
capivaras, que jamais deixaram de habitar suas margens e leito.Foi a
partir do Paraopeba, que Wagner me introduziu em toda bacia do Rio São
Francisco, incluindo o Rio das Velhas, Jequitai,
Paracatu, Prata, Urucuia e Carinhanha e o lago de Três Marias. Foi ele também quem me apresentou a Bacia do Rio
Doce, que na época não tinha na sua bacia, ainda importantes, áreas
mineradoras, mas que irrigava o Vale do Aço e antes dele toda região de João
Monlevade e Itabira onde estavam às siderúrgicas, que evidentemente se serviam
das suas águas. As minhas
andanças por Minas Gerais, que foram muitas, já há 40 anos, mostrava o “total desprezo” pela natureza. Uma
coisa que sempre me assustou em Minas foi o total desprezo pela proteção dos
mananciais, seja pela desproteção das nascentes, seja pela eliminação da mata
ciliar em todos os rios, indistintamente. No próprio
Cerrado, a exploração do carvão para as siderúrgicas em Contagem, a devastação
era geral pela instalação das carvoeiras, eliminando até mesmo a proteção das “veredas” e sua vegetação de “buritis”, que protegiam seus “olhos d’água”, (nascentes de regatos do
cerrado), que sempre representaram a sobrevivência da fauna e flora. Foi pela
guia do “sertanista mineiro”, meu
amigo Paulo Auler, que constatei o mesmo no Cerrado do Noroeste Mineiro em João
Pinheiro e arredores na Bacia do Rio Paracatu. Assim como em conhecer os
primeiros projetos de irrigação da CODEVASF
em Pirapora – MG e o Projeto do Rio Jaíba com as águas do Velho Chico, que
recebeu na época investimento recorde de US$ 1 bilhão do Governo Japonês. Amigos,
não narro os tempos atuais. Narro o que vi há 40 anos lá atrás. Desolação. Mais
recentemente tive a oportunidade de sobrevoar o Velho Chico em Barra, no interior da Bahia e a visão do
assoreamento do rio era impressionante, bem como das suas margens totalmente
desmatadas. Viajei também pelo Cerrado Mineiro na região de Patos de Minas e
ali a visão dos projetos irrigados com águas do Rio Grande dominava a paisagem. Na
verdade, com a abertura da Frente Agrícola no Cerrado com projetos irrigados,
que vão desde o Estado de Minas Gerais até o Sul do Piauí cobrindo vários
milhões de quilômetros quadrados, nos traz a memória a pujança da agricultura
do meio oeste americano, com sua riqueza e ao mesmo tempo seus problemas. Por
lá o Rio Colorado não consegue mais chegar ao mar, além de que muitas áreas não
mais irrigáveis tendem à desertificação. O que acontecerá com o Velho Chico com
tantos projetos de irrigação e sua transposição?Alguém, algum dia, calculou os “ganhos e perdas” dessa intensa exploração de terras e rios?
Aprendemos alguma coisa como exemplo americano, ou até mesmo com a tragédia do
Mar de Aral na Rússia, que simplesmente desapareceu com a exploração predatória
da agricultura? Enquanto isso, vamos por aqui chorando pelo desastre
anunciado de Mariana. Tão somente porque é o desastre de hoje. Não tenho a
menor dúvida que em poucos meses as águas do Rio Doce estarão correndo limpas
até a sua foz, a menos que grandes inundações aconteçam em sua bacia e que irão
arrastar mais lama pelo seu curso. Assim como ninguém responsavelmente poderá
calcular esse impacto em extensão e tempo. Até que ponto esses detritos são tão
contaminantes? O Rio Paraopeba sempre chegou com águas cristalinas no
Lago de Três Marias. É da tarefa da Natureza, com o filtro natural das suas
cachoeiras, assim como faz até com o Rio Tietê em São Paulo, correndo a 150
quilômetros da Capital.Conheço muito bem toda a costa do Rio de Janeiro e
Espírito Santo e já há muito tempo todas essas “fozes de rios” tem muito pouca vida e mangues. Para se tiver uma
ideia o caranguejo que se come no Nordeste hoje vem de Piauí e Maranhão, pois
os manguezais foram devastados por toda a costa. Nossos rios há muito tempo carregam outros tipos de
contaminação por poluição industrial e nisso se inclui o Rio Doce. A questão é,
o que estamos fazendo para não destruir nossos recursos tão generosamente dados
pela Natureza? Vamos seguir o exemplo da China? Enquanto isso não chore por Mariana, mas por tudo o
que não se faz por todos os rios e “marianas”
de todo o Brasil.
Das Percepções & Pensamentos Partilhados
Antônio Figueiredo - Escritor & Cronista -
São Paulo – SP -
Antônio Figueiredo - Escritor & Cronista -
São Paulo – SP -
Obs.:
Todas as obras publicadas na Sala de Protheus
são de inteira responsabilidade de seus autores.
O Editor!
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