Os
Disquinhos de Ossos!
Essa é a história dos "roentgenizdat", como eram
conhecidos os discos confeccionados em chapas usadas de Raios-X, ou "roentgen ray". Numa tentativa
de agradar os soldados e oferecer um serviço social que amenizasse a separação
das famílias durante a 2ª Guerra Mundial, os americanos colocaram máquinas para
os soldados gravarem discos, compactos de 78rpm,
os V Discs.
Eram umas cabines automáticas, onde se
colocava uma moeda ou ficha, tinha um microfone onde a pessoa podia gravar uma
mensagem de voz para seus parentes em um registro flexível; eram encontradas em
salões de fotografia e a pessoa gravava uma mensagem. Essa máquina riscava os
sulcos e o disco saia prontinho pra ser tocado em qualquer vitrola. na
velocidade de 78 rpms. A máquina para
fazer estas gravações foi originalmente concebida para fazer "cartões postais de som", que eram uns disquinhos
flexíveis, para economizar material, e leve, para serem enviados pelo correio.
Depois da Grande Guerra, muitas dessas
máquinas ficaram na Europa e foram levadas para a Rússia. Nos anos 50 eles
queriam discos de jazz e quando conseguiam um disco, gravavam o som em um
desses disquinhos. No início de 1950, o rock-n-roll
americano começou a se infiltrar na culturalmente isolada União Soviética e
seus países satélites... E, claro, foi prontamente proibido. Mas os russos
também queriam também ouvir Chuck Berry e
Elvis, depois seguidos pelos Beatles
e Stones.
Devido à falta de gravações da música
ocidental disponíveis na URSS, as pessoas tinham de contar com discos
contrabandeados através da Europa Oriental, onde o controle sobre esse material
era menos rigoroso. Ou por marinheiros suecos e finlandeses chegando aos portos
de Riga e Leningrado. Tais restrições
significava que o número de gravações permaneceria pequena e preciosa. Mesmo
assim essa música nova encontrou o seu caminho para as ruas através de um pouco
de ingenuidade combinada que estava disponível no momento.
Fabricantes de gravações underground, que eram conhecidas como "roentgenizdat", usavam
gravadores amadores como o Voice-O-Graph,
de cabine, que era útil e com baixo custo, para gravar sulcos em discos virgens
de vinil. Uns caras até esconderam algumas máquinas sem as cabines. Mas aí
acabou o material. Até que um residente de medicina, um dia, tentou usar uma
chapa usada de Raio-X e deu certo,
isso foi uma revolução na pirataria por lá. Os
raios-x deformavam facilmente, não eram tão bons como um disco real, mas
eles gravavam um sulco bom o suficiente para valer a pena o dinheiro um dia de
almoço e o risco de prisão só para experimentar um pouco da música dos EUA. Estes álbuns foram vendidos como bootlegs, às escondidas, nos mercados e
através de amigos de um amigo, em quantidades inumeráveis. O processo acabou
morrendo com a chegada dos gravadores de fita magnética, mas esses álbuns ao
vivo continuam nas mãos de colecionadores particulares. Valem fortunas.
Eu não sei o nome do inventor que usou
chapas de raio-X como material de
base para discos, mas esse método tornou-se tão difundido na Hungria, que a
Rádio Nacional Húngara fez gravações de som em chapas como parte de um projeto.
Um disquinho, que só era gravado de um lado, custava cerca de 1 rublo cada no
mercado negro, mas durava apenas alguns meses, ao contrário dos 5 rublos para
um disco de vinil de dois lados. O custo do registro era o mesmo garrafinha de vodka de 250ml, a mesma quantia do "dinheiro do almoço", dado aos
maridos por suas esposas econômicas (na
Rússia, as mulheres geralmente controlavam o orçamento familiar). Assim, o
disquinho poderia ser comprado pulando um almoço ou deixando de comprar uma
bebida por dia. Cerca de 3.000.000 desses registros altamente ilegais foram
distribuídos clandestinamente na URSS até 1958 (sem o nome do artista ou o título da canção do disco, apenas um número
riscado) antes da KGB perceber o que eram. No final dos anos 50, o governo
já sabia dos roentgenizdats, e tornou
tudo ilegal em 1958. Funcionários de segurança tomaram medidas para acabar com
o maior cartel em 1959, enviando os líderes para a prisão, a partir de uma
organização pela Komsomol de "patrulhas música" que mais
tarde se comprometeu a reduzir a atividade ilegal de música em todo o país.
Mesmo assim continuaram a ser produzidos na década de 60.
Jovens em Leningrado foram presos por fazê-los, e enviados para o Gulag por sete anos. É preciso entender
que a música ocidental era considerada uma grande ameaça para a KGB. O Rock foi proibido na URSS, banido de todos os meios de
comunicação e imprensa até 1986. O Rock era proibido até de ser pronunciado,
assim com cantar qualquer canção em inglês.
O que acabou com essa engenhosa
indústria, não foi o governo soviético e sua opressão, mas o surgimento de fitas magnéticas, os gravadores de rôlo. Já nos anos 70 as
fitas cassete chegaram e se tornaram o BitTorrent
daquele momento.
Dos Entendimentos & Compreensões
de
Sérgio AVELLAR - Profissional
Multimídia.
Comunicólogo com doutorado em
"Master en Publicidad" pela Universidad de Barcelona, onde se
aprofundou sua tese sobre a "Cultura de Massas e a Perda das
Identidades".
Autor e mantenedor da Rádio RockPuro,
um formato exclusivo.
avellar@rockpuro.net
Release:
http://rockpuro.net/sergioavellar.html
Obs.: Todas as obras publicadas na Sala de Protheus
são de inteira responsabilidade de seus autores.
O Editor!
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