#CrônicasDaVidaReal:
“Bom dia para você que é confundida com um GPS por sua mãe...
Atendo o celular: "Onde é o Dr. Crispim ? Eu estou perdida!!"
"Ao lado do Ed. das Clínicas, mãe"
"Onde é o Ed. das Clínicas? Eu não sei! (ela já passou por algumas consultas lá, acompanhada por mim).
"Mãe, onde você está?"
"Perto dos Correios..." - (suspiro)
Atendo o celular: "Onde é o Dr. Crispim ? Eu estou perdida!!"
"Ao lado do Ed. das Clínicas, mãe"
"Onde é o Ed. das Clínicas? Eu não sei! (ela já passou por algumas consultas lá, acompanhada por mim).
"Mãe, onde você está?"
"Perto dos Correios..." - (suspiro)
Sim, eu a guiei por telefone até a entrada do estacionamento
subterrâneo do prédio...
Detalhe:
Ela mora há VINTE ANOS em Brasília!
O post acima
estava no Face book da minha filha mais velha, Fabiana, na semana passada e,
infelizmente, a situação relatada foi real. Eu vivo me perdendo.
Fiquei
indignada, claro, e teria respondido à provocação na hora, mas, infelizmente,
assim que cheguei ao bendito consultório descobri que havia esquecido em casa
os óculos de grau, bem ao lado da carteira de motorista... Também vivo
esquecendo as coisas.
A questão
dos óculos foi meio complicada... Para a moça que me atendeu, coitada. Pobre
Damaris, obrigada a ler cinco formulários enormes, cheios de perguntas
constrangedoras, e anotar cuidadosamente as respostas, já que não enxergo um
palmo à frente do nariz sem eles.
O esquecimento
da carteira de motorista foi mais assustador; principalmente porque o tanque de
gasolina estava na reserva. Enquanto procurava freneticamente por um posto, o
mostrador, sádico, avisava que a autonomia estava em 0 km e eu já imaginava o DETRAN aparecendo, para saber por que
meu carro estava empacado no meio da rua, pedindo a carteira... E os documentos
do veículo.
Já segura em casa
– de onde, diga-se de passagem, sequer
deveria ter saído naquele dia 15 com cara de 13 – fiquei matutando sobre
meus esquecimentos e se não deveria marcar um neurologista, um geriatra, uma
concessionária, uma revisão qualquer.
Daí para lembrar
minha mãe, e tentar descobrir se podia –
mais uma vez – jogar a culpa nela, foi um pulo.
Minha mãe era uma mulher belíssima e muito
inteligente, escreveu vários livros, alguns deles premiados, criou duas filhas
praticamente sozinha. Clara Ramos sempre foi minha “ídala”, mas tinha alguns pequenos defeitos, como todo mundo.
Dirigia muito mal e
super devagar, sempre na faixa da esquerda. Todos os palavrões que sei, aprendi
com os motoristas que nos ultrapassavam, e eles sempre nos ultrapassavam e nós
nunca ultrapassávamos ninguém. Se não fossem os postes, eu poderia jurar que
andávamos de ré.
Minha linda e
distraída mãe vivia esquecendo as coisas, ou as lembrava em dobro. Na década de
70 a moda, em óculos escuros, era um modelo horroroso, que não dobrava, e
deixava a usuária parecida com a Formiga Atômica. Ela tinha um desses. Na saída
do cabeleireiro, uma vez, ao pagar a conta, reparou que a atendente estava olhando
feio para ela e não conseguiu descobrir a razão... Até chegar em casa e se
olhar no espelho: estava com um óculos na cabeça e outro nos olhos. Pergunta
quem devolveu o sobressalente?
Mais apaziguada
com os desastres da manhã relembrei o dia em que saí do Rio, rumo a Brasília,
há 31 anos. Fui dirigindo até o Galeão, com Fabiana e meu gato siamês atrás,
Pedro na barriga e minha mãe no banco do carona. Passei o trajeto inteiro
explicando o caminho para a casa dela.
“Presta
atenção, mãe, na volta você vai passar por essa entrada. Não entra, se não você
vai cair na Ponte Rio-Niterói”
“Está
bem.”
Quinze dias depois
chega a carta, muito animada, em que ela contava que, depois de algumas
aventuras, havia conseguido chegar inteira em casa porque, imagine só, claro
que tinha entrado no lugar errado e dado de cara com a ponte.
Qualquer pessoa
que não fosse minha mãe, teria ido até Niterói e feito o retorno. Ela achou
mais fácil engatar uma ré. Um minuto depois apareceu um guarda de motocicleta e
deu-se o seguinte diálogo.
“Minha senhora, eu prometo que não a multo se
conseguir explicar o que estava fazendo dirigindo de ré na Ponte Rio-Niterói!”
“Pois é, seu guarda, eu estou muito abalada, porque acabei de deixar
minha filha mais nova, grávida, com minha neta e o gato dela, no Galeão, de
mudança para Brasília. Vão morar lá. O senhor conhece Brasília?”
“Não senhora”
“Bela cidade. Pois então, eu estava voltando, tão emocionada, que
entrei errado e de repente me vi indo para Niterói. Mas não conheço ninguém em
Niterói, moro em Botafogo, não quero ir para Niterói, então achei melhor dar
uma ré e sair de fininho!”
“Mas a senhora não pode fazer isso! Tem que ir até Niterói e fazer o
retorno para o Rio!”
“Seu guarda, eu ainda nem cheguei a Niterói e já aprontei essa
confusão. O senhor tem certeza que quer que eu tente?”
“Está bem, senhora, continua de ré que eu vou lhe escoltar até a
primeira saída, se me prometer que vai direto para a sua casa”.
É,
acho que não preciso de neurologista, deve ser genético. Também não preciso
responder ao post da Fabiana, a batata dela está assando!
De Brasília – DF –
Beatriz Ramos
Cronista –
Exclusivo para a Sala de Protheus
Nenhum comentário:
Postar um comentário